Quem não conhece a fábula de Robin Hood ? Contada em verso e prosa, a história desse herói que tirava dos ricos para dar aos pobres se tornou uma lenda que perpassou o tempo e o mundo, mostrando o quanto a falta de empatia pode levar um governante a extorquir, pelo imposto, os cidadãos. Os tributos são necessários para que o Estado cumpra o seu papel, mas o exagero em sua arrecadação pode levar a uma revolução, onde os mais pobres rompem o limite da disciplina em defesa de suas sobrevivências.
Diz a lenda que há muito tempo a Inglaterra era governada pelo Príncipe John, enquanto o Rei Ricardo lutava nas cruzadas. Sem empatia e muito perverso, o Príncipe John ordenou ao xerife de Nottingham que aumentasse o imposto, já bastante extorsivo, dos já empobrecidos cidadãos daquela comunidade. Revoltados, o herói Robin Hood e seu fiel escudeiro João Pequeno, resolveram agir em desconformidade com a lei para buscar a justiça social. Adotaram a máxima que os fins justificavam os meios e passaram a desviar os recursos que eram arrecadados por ordem do Príncipe para distribuir entre os pobres. A falta de empatia dos governantes abriu a porta da revolta dos governados.
Esses dias vi que o Governo do Distrito Federal mandou um Projeto de Lei aumentando a alíquota modal do ICMS de 18% para 20%. Alíquota modal é aquele que recai sobre a maioria dos produtos à venda no mercado. É a alíquota geral para nossos produtos, a de maior impacto no consumo dos brasilienses. O ICMS tem algumas alíquotas excepcionais, como produtos da cesta básica (12%) e produtos considerados “não essenciais” como por exemplo bebidas alcoólicas e cigarro (25%). O que está fora desses dois grupos especiais segue uma alíquota padrão, também chamada de modal. Assim, a maior parte dos produtos consumidos em Brasília sofrerão aumento da carga tributária, caso essa lei seja aprovada.
A justificativa do governo para a proposta de aumento da carga tributária é a queda de arrecadação, fruto das propostas de subsídios aprovadas no governo federal passado, que trouxe um déficit na arrecadação do Distrito Federal e dos demais entes federados. Os mesmos que serão impactados por esse aumento do ICMS foram os que lutaram para manter o Fundo Constitucional sem corte e lutam para manter os repasses de FPM/FPE na condição do ano passado, para não ter queda no orçamento. Quem ajuda a agenda institucional do governo é penalizado com aumento de impostos. Triste realidade de quem gera emprego e renda no Distrito Federal.
Nenhuma revolta ou injustiça pode ser justificativa para contrariar as leis. O crime não pode ser visto como o meio que justifica os fins. Isso é indefensável. Mas o exagero da saga arrecadatória se torna uma extorsão que ultrapassa o dever social de contribuir para a missão do Estado de atender a sociedade.
Os negócios do Distrito Federal não conseguem repassar os custos de um aumento da carga tributária em sua totalidade para seus produtos. Terão, portanto, que absorvê-lo com sua margem de lucro, já bastante reduzida. A forma que Robin Hood encontrou para a distribuição de renda foi criminosa, mas mostrou que a sociedade tem limites em sua subserviência ao poder do Estado. O desfecho da lenda é a volta do Rei Ricardo que, ao chegar, demonstrou empatia com seu povo, reconheceu a liderança e representatividade de Robin Hood e se aliou a sua luta, destituindo o príncipe e atendendo os anseios do povo.
Que o espírito do Rei Ricardo e a luta de Robin Hood inspire as autoridades locais e que elas compreendam que aumentar a carga tributária é a forma mais perversa de aumento de arrecadação. Isso porque tira mais dos mesmos e impede o crescimento da economia, impactando a geração de empregos e a distribuição de renda. O contribuinte não suporta mais a insaciável necessidade de aumento de arrecadação de quem faz a gestão da máquina pública no Distrito Federal.
Uma lenda é assim, está sempre atual, porque tem na sua essência o alinhamento com a vida das pessoas, com suas interpretações e reflexões diversas. A lenda de Robin Hood precisa ser a inspiração para uma reflexão no Distrito Federal, para que possamos ter um Estado que cumpra sua missão e que não impeça o sonho empreendedor de quem luta diariamente para manter aberto seus negócios, gerando emprego e renda e sustentando milhares de famílias no Distrito Federal.
Valdir Oliveira é ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do Distrito Federal
Fonte: Metrópoles